quinta-feira, 29 de julho de 2010

Noção platônica de beleza























la disputa - 1510-11 Rafael Sanzio



Eis, com efeito, em que consiste o proceder corretamente nos caminhos do amor ou por outro se deixar conduzir: em começar do que aqui é belo e, em vista daquele belo, subir sempre, como que servindo-se de degraus, de um só para dois e de dois para todos os belos corpos, e dos belos corpos para os belos ofícios, e dos ofícios para as belas ciências até que das ciências acabe naquela ciência, que de nada mais é senão daquele próprio belo, e conheça enfim o que em si é belo.

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- Quando então – continuou ela – é sempre isso o amor, de que modo, nos que o perseguem, e em que ação, o seu zelo e esforço se chamaria amor? Que vem a ser essa atividade? Podes dizer-me?
– Eu não te admiraria então, ó Diotima, por tua sabedoria, nem te freqüentaria para aprender isso mesmo.
– Mas eu te direi – tornou-me. – É isso, com efeito, um parto em beleza, tanto no corpo como na alma.
– É um adivinho – disse-lhe eu – que requer o que estás dizendo: não entendo.
– Pois eu te falarei mais claramente, Sócrates, disse-me ela. Com efeito, todos os homens concebem, não só no corpo como também na alma, e quando chegam a certa idade, é dar à luz que deseja a nossa natureza. Mas ocorrer isso no que é inadequado é impossível. E o feio é inadequado a tudo o que é divino, enquanto o belo é adequado. Moira então e Ilitia do nascimento é a Beleza. Por isso, quando do belo se aproxima o que está em concepção, acalma-se, e de júbilo transborda, e dá à luz e gera; quando porém é do feio que se aproxima, sombrio e aflito contrai-se, afasta-se, recolhe-se e não gera, mas, retendo o que concebeu, penosamente o carrega. Daí é que ao que está prenhe e já intumescido é grande o alvoroço que lhe vem à vista do belo, que de uma grande dor liberta o que está prenhe. É com efeito, Sócrates, dizia-me ela, não do belo o amor, como pensas.
– Mas de que é enfim?
– Da geração e da parturição no belo.
– Seja – disse-lhe eu.
– Perfeitamente – continuou. – E por que assim da geração? Porque é algo de perpétuo e mortal para um mortal, a geração. E é a imortalidade que, com o bem, necessariamente se deseja, pelo que foi admitido, se é que o amor é amor de sempre ter consigo o bem. É de fato forçoso por esse argumento que também da imortalidade seja o amor.

Fontes:

Platão, O Banquete. São Paulo: DIFEL, 1986, 211c-d.
Platão, O Banquete. São Paulo: DIFEL, 1986, 206b-207a. Grifo nosso

A arte e o trabalho





















St Jerome -1480 [obra inacabada]

Da Vinci, Leonardo

A arte é quase tão antiga quanto o homem. É uma forma de trabalho, e o trabalho é uma atividade característica do homem. (...) O homem se apodera da natureza transformando-a. O trabalho é a transformação da natureza. (...) Um meio de expressão – um gesto, uma imagem, um sim, uma palavra – era tão instrumento como um machado e uma faca. Era apenas outro modo de estabelecer o poder do homem sobre a natureza.





FISCHER, Ernst. A necessidade da arte. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1973, p.40.

O luto da arte

A tese da morte da arte ainda significa mais do que parece























The Death of Marat - 1793


Damien Hirst: a arte contemporânea, sendo trabalho do luto, prova sempre a experiência do desgosto

A discussão sobre a morte da arte teve um lugar essencial nas Lições de Estética, de Hegel, no século 19. Não se pode perder de vista que a morte da arte à qual Hegel se referia era a da arte bela e não da arte de modo geral. Se Hegel tem razão, em havendo uma morte da arte que não deve ser generalizada, trata-se de entender que tipo de arte, para além da arte bela, sobreviveu. Em um século de genocídios, ditaduras e violências de toda sorte, a arte é a memória da sua própria morte.

A pré-história dessa percepção está na Crítica da Faculdade de Julgar, de Kant, que antes afirmou a existência de dois sentimentos, o belo e o sublime, como sustentáculos da experiência estética. Belo – a sensação de prazer com os objetos agradáveis – e sublime – um misto de prazer com desprazer – são formas de acesso subjetivo à beleza, tanto da natureza quanto das artes. Kant define a arte bela como aquela que pode representar de modo belo até mesmo as coisas feias. A tarefa histórica da arte sempre foi a de colocar beleza no mundo e suplantar o feio. Criamos essa expectativa e isso hoje em dia não nos ajuda.

Mas o próprio Kant disse que havia uma espécie de feiura, que não pode ser representada de acordo com a natureza sem cancelar a complacência estética, ou seja, a nossa capacidade de perceber a beleza em geral e a beleza da arte. Kant refere-se à feiura que desperta asco. O asco, segundo Kant, é uma “sensação peculiar” marcada pela imposição do objeto feio que imediatamente se nos lança sobre os sentidos, sem que desejemos aceitar sua presença. O filósofo espanhol Eugenio Trías dá um exemplo repugnante só de ler: quem pisa em um rato morto e eviscerado na rua tem a sensação de que ele vai parar dentro da boca. A experiência do asco se dá como se um prato de merda fosse oferecido para se comer.

O asco é uma espécie de sentimento impossível, por estar na contramão do gosto. Podemos traduzi-lo por nojo. E nojo é algo que se traduz por luto. A experiência do asco ou do nojo, como experiência do des-gosto, é da mesma ordem da experiência do luto, de algo que não desejamos e que mesmo assim se impõe. A lástima pela perda de um objeto amado, mas também do gosto – seja pela arte, seja pela vida – que acompanhava aquele objeto é experiência disseminada em nossa cultura, da qual a arte atual vem a ser a apresentação mais clara.

A arte, do asco ao luto

O luto é sempre uma reação à perda de um objeto amado. É, portanto, a experiência da morte enquanto ela pode ser conhecida: a morte dos outros, das coisas, das experiências. Até mesmo, como em Luto e Melancolia, de Freud, a perda de uma abstração, de um ideal qualquer. Nunca a da epicuriana morte que não encontraremos, pois já não estaremos quando ela aparecer. A arte contemporânea é experiência enlutada e, por isso, dói tanto tratar dela. Encará-la é experimentar o luto na forma de sua exposição possível. Mas, se há entre arte e vida, entre ficção e realidade, uma relação que é sempre de mimese, por imitação ou por mimetismo, e se há tanta perda na vida, a arte não deveria ser nosso resgate para além do que a vida nos dá sem nenhuma elaboração?

A promessa romântica da arte é que ela viria nos salvar da vida. Mas, após a perda da ingenuidade romântica, por que ainda esperamos tanto da arte? Arte é apenas um conceito que tem tão pouco valor quanto pouco uso nos dias de hoje. No entanto, arte ainda é, como conceito, algo que vai na frente da nossa sempre atrasada sensibilidade. Que a arte mova nossa sensibilidade é a esperança sem fundamento de muitos, mas sensibilidade é uma formulação imprecisa entre o perigoso culto da emoção e os sentimentos que só são elaborados mediante a interferência da racionalidade capaz de criar conceitos. Não há chance de que arte hoje seja mais do que uma construção para fazer pensar.

Temos na experiência contemporânea da arte a autopresentificação do seu próprio luto. Como se a arte ainda estivesse no período enojado em que tem que se haver com a memória de um cadáver que é ela mesma e que, na verdade, mimetiza o estado das coisas de um mundo em crise de sentido. Assim é que a obsolescência do conceito de arte o coloca na posição de um conceito-memória. Um conceito que foi válido, mas que perdeu sua circunstância na atualidade. Arte não é mais a bela arte, ainda que possamos com muito esforço descobrir nas obras que a beleza também é um conceito e, como tal, uma visão das coisas.

O paradoxo do gosto

O que a arte contemporânea nos sugere é a experiência do paradoxo do gosto. Como é possível “apreciar” esteticamente aquilo que repugna se neste momento a experiência estética como mediação entre sensibilidade e racionalidade foi anulada? A questão é que a arte contemporânea, sendo trabalho do luto, acontecendo na contramão do gosto, provoca sempre a experiência do desgosto. Por isso, a arte conceitual tem tanto espaço em nosso tempo, por chamar ao pensamento em tempos de cancelamento da sensibilidade. É como se toda obra nos enviasse a mensagem: se não podemos “gostar”, podemos “pensar”. É o paradoxo da inestética: a sensação é de perda da sensibilidade na arte; mais do que um problema da arte, é problema da cultura na qual ela surge. Um artista como Damien Hirst, com seus bezerros e tubarões no formol, não é, portanto, julgável segundo o padrão do gosto pela arte bela, porque estamos em tempos de perda do gosto. O que será que ele nos mostra que não sabemos pensar?

Com isso se consegue compreender o que acontece com a arte atual. Ela é a experiência da morte da própria arte bela nestes tempos de desgraça cultural. Tempos tensos: de um lado tragicofílicos – desejamos a tragédia – e de outro tragicofóbicos – evitamos a morte a qualquer custo –, como disse Hans Gumbrecht. Podemos dizer, nestes tempos, que a arte se faz na ordem do trágico, este sentimento da “morte em mim”, da morte como experiência subjetiva, como imagem da melancolia que nada mais é do que a morte do eu e do pensamento que sempre foi a prova de que existia algo chamado “eu”. Não, não exageremos.

A arte contemporânea não é nem trágica nem melancólica. Enlutada, ela nos pede que ultrapassemos a memória da morte e reinventemos o presente. Só o que impede isso é o capital culto à desgraça em que vivemos hoje. O gozo atual é com a ideologia da morte como um fim, quando, na verdade, estúpidos e conceitualmente avarentos, não sabemos entender o valor e o poder das transformações históricas das quais a arte nos dá apenas uma imagem para nos fazer acordar. Mas quando até mesmo a desgraça se tornou um “capital”, haverá espaço para a arte que denuncia o seu caráter capitalista?

(Marcia Tiburi)

terça-feira, 27 de julho de 2010

O bom senso
















O bom senso é a coisa do mundo melhor partilhada: pois cada um pensa estar tão bem provido dele, que mesmo os mais difíceis de contentar em qualquer outra coisa não costumam desejar tê-lo mais do que o têm.
Não é verossímil que todos se enganem nesse ponto: antes, isso mostra que a capacidade de bem julgar, e distinguir o verdadeiro do falso, que é propriamente o que se chama o bom senso ou razão, é naturalmente igual em todos os homens; e, assim, que a diversidade de nossas opiniões não se deve a uns serem mais racionais que os outros, mas apenas a que conduzimos nossos pensamentos por vias diversas e não consideramos as mesmas coisas. Pois não basta ter o espírito bom, o principal é aplicá-lo bem. As maiores almas são capazes dos maiores vícios, assim como das maiores virtudes; e os que andam muito lentamente podem avançar muito mais se seguirem sempre o caminho reto, ao contrário dos que correm e se dele se afastam.

DESCARTES,René, Discurso do Método

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Poder






















Os antigos, escreve Jean Bodin (1530-1596), chamavam de República uma sociedade de homens reunidos para viverem bem e felizes. Mas será mesmo este o objetivo de uma República? Para autores modernos como Jean Bodin e Thomas Hobbes (1588-1679), as Repúblicas só podem cuidar das virtudes morais quando estão amparadas quanto ao que lhes é necessário, o econômico passa antes do ético. Esta é a primeira diferença entre a concepção moderna e a antiga da Cidade. A segunda aparece na definição que Bodin faz da República: reto governo de várias famílias e do que lhes é comum, havendo um poder soberano. O que supõe que se reconheça às famílias, às atividades privadas dos homens, uma existência própria - e mesmo, de direito, prévia à Cidade. Mas é preciso, acrescenta Bodin, que haja alguma coisa de comum e pública: como o domínio público, o erário público, as ruas, as muralhas... as leis, os costumes, a justiça... as penas..., pois não existe República se não há nada público.



Contudo, este espaço público é habitado por indivíduos ou grupos (famílias) que, em sua dispersão, nunca constituiriam, sozinhos, uma comunidade entendida como um corpo único. Os indivíduos formam apenas uma multidão, quer dizer, um número de homens distinto pelo lugar das suas residências, como o povo da Inglaterra ou o povo da França (Hobbes). Ora, nesse estágio (ideal) de mera congregação geograficamente determinada, o povo não é um corpo político. Ainda precisa de uma instância que coordene e unifique os indivíduos. É aqui que intervém a noção de potência. A República, sem potência soberana que uma todos os membros e partes, e todas as famílias e colégios, num corpo, já não é mais República (Bodin). Estamos, então em condições de compreender o que é, este grande Leviatã que é chamado de República ou Estado (Hobbes). O que é ele? Um homem artificial, um genial e gigantesco autômato, criado para defesa e proteçãodos homens naturais.


Fonte
LEBRUN, Gerard. O que é poder. São Paulo: Abril Cultural/Brasiliense, 1984.

Refrigerantes: É isso aí

De bebidas vendidas em farmácias e indicadas para tratar dor de barriga, os refrigerantes viraram símbolo de rebeldia e hoje estão entre os nomes mais conhecidos do mundo



























por Celso Miranda e Ricardo Giassetti

"Amada minha, ficarei deveras lisonjeado se aceitares me acompanhar à pharmacia para um xarope carbonatado.” Um convite para tomar xarope na farmácia pode não soar como uma cantada lá muito romântica hoje em dia, mas, no fim do século 19, era tudo que uma jovenzinha americana queria ouvir. Afinal, quem não queria experimentar a grande onda, os refrigerantes? Os primeiros deles nasceram numa época em que se confundiam as propriedades medicinais das fontes de águas minerais com as recentes invenções de Joseph Priestley (1767) e John Mathews (1832). Priestley criou um meio de produzir água gaseificada artificialmente, a soda. Mathews desenvolveu o que ficaria conhecido como soda fountain, um aparato que produzia água com gás de forma simples, diretamente no balcão da farmácia. Acreditava-se que a água gaseificada tinha propriedades terapêuticas e por isso ela era recomendada para diversos tipos de tratamento, de simples cólicas à poliomielite.

Por volta da metade do século 19, já era comum encontrar fontes de soda instaladas nas farmácias por todos os Estados Unidos. “Não se sabe exatamente quem foi o primeiro a colocar substâncias adoçantes e corantes na água gasosa, mas certamente isso aconteceu numa farmácia, onde as misturas eram feitas e vendidas como tônicos”, diz Jorge Fantinel, engenheiro químico e consultor das empresas do setor, autor de Os Refrigerantes no Brasil. As primeiras experiências foram feitas com xarope de limão, a soda limonada. Imediatamente depois vieram as misturas com morango, noz-de-cola – um fruto africano parente do cacau, rico em cafeína, conhecido no Brasil como orobô – e ginger-ale, feito de gengibre. Nessa época, eles ainda não tinham o nome de refrigerantes e eram chamados de xaropes gasosos. Mas, vendidos a 1 centavo de dólar, já eram um sucesso.

O crescimento do consumo fez muitas farmácias se transformarem em pontos de encontro. Outras deixaram de lado a venda de remédios para aumentar o espaço de atendimento dos ávidos bebedores de xaropes gasosos. Fenômeno semelhante ocorreu com os proprietários, que começaram a competir pelos fregueses criando xaropes cada vez mais elaborados, fechando suas lojas para se dedicar à produção e venda no atacado. As três maiores marcas norte-americanas atuais foram criadas num espaço de pouco mais de dez anos, por três desses ex-farmacêuticos. Charles Alderton inventou a fórmula da Dr. Pepper, em 1885. No ano seguinte John Pemberton tirou da manga um concentrado com “qualidades estimulantes” à base de noz-de-cola, folhas de coca e outros ingredientes ao qual daria o nome de Coca-Cola. Em 1898 surgiu a Pepsi-Cola, que usava a mesma noz-de-cola e uma enzima para “ajudar na digestão”, a pepsina.

Mas sair das drogarias e chegar sãos, salvos e borbulhantes à casa do consumidor era uma tarefa impossível para os refrigerantes. O limitador, nesses primeiros tempos da indústria, era a embalagem. “Apesar de o primeiro xarope engarrafado datar de 1835, antes da invenção da máquina para moldar vidro, obra do americano Michael Owen, em 1904, as garrafas eram sopradas artesanalmente e variavam na forma e tamanho, dificultando o transporte e o empilhamento”, afirma Jorge. Outra dificuldade era a vedação das garrafas. Das rolhas com arame (similares às de champanhe) às tampas Hutchinson, que seguravam a pressão de dentro para fora, os progressos foram tímidos e os acidentes em depósitos, constantes, transformando o estoque de refrigerantes numa atividade barulhenta (e dispendiosa). A revolução que levou definitivamente o refrigerante para dentro das casas das pessoas foi a tampinha coroa, inventada em 1892 pelo americano William Painter. A rolha metálica recoberta de cortiça (posteriormente trocada pelo plástico) era perfeita para conter a pressão do líquido gasoso. Daí por diante, os xaropes continuariam sendo vendidos nos balcões, mas o caminho até a mesa do almoço de domingo estava definitivamente aberto.

Guaraná Brasil

Por aqui, a moda das fontes de soda não pegou e a indústria partiu direto para o engarrafamento. “Os equipamentos eram precários para gaseificar água e mais ainda para produtos com açúcar, que necessitam de temperaturas de operação mais baixas e pressões maiores. Nosso clima não ajudava a indústria”, diz Jorge Fantinel. Enquanto Coca, Pepsi e Dr. Pepper se industrializavam, abriam novas fábricas e melhoravam a distribuição nos Estados Unidos, um médico de Resende, no Rio de Janeiro, descobriu que uma frutinha vermelha e tipicamente brasileira, o guaraná, dava um tremendo xarope. Em 1905, o doutor Luiz Pereira Barreto elaborou um método de processamento da fruta.

A partir de 1906 a F. Diefenthalerr, de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, lançou a primeira linha de refrigerantes industrializados, incluindo a Limonada Gazosa, o Guaraná Cyrilla e a Água Tônica de Quinino. Cervejarias como a Brahma não demoraram a entender o potencial comercial dos gaseificados. A empresa carioca lançou a marca Excelsior em 1907. A paulistana Antarctica começou a produzir a Soda Limonada em 1912 e, em 1921, lançou o Guaraná Champagne. “A fórmula é a mesma até hoje, adaptada apenas para se adequar melhor às mudanças da linha de produção,” afirma o químico Orlando de Araújo, consultor da AmBev, uma das principais empresas do setor.

As precárias condições da infra-estrutura de estradas e ferrovias brasileiras e as dificuldades logísticas mantinham os fabricantes e distribuidores reféns de suas próprias regiões. A demanda crescente, mas limitada geograficamente, fez com que marcas menores aparecessem para atender cidades do interior dos estados. Em São Paulo, maior mercado nacional, surgiram, na década de 1930, fábricas em Jundiaí, Itu, Bauru e São José do Rio Preto. No Maranhão, Jesus Norberto Gomes criou, em 1920, um guaraná cor-de-rosa que até hoje é comercializado. O guaraná Jesus atende seus adoradores e é um dos mais vendidos da região.

“Até os anos 60, alguns processos ainda eram manuais. Usávamos máquinas com pedais mecânicos para colocar as tampinhas nas garrafas e colávamos os rótulos com cola de maisena”, afirma Ricardo Vontobel, que na infância trabalhou na fábrica do pai, a Vonpar, fundada em 1953, no Rio Grande do Sul, e que hoje é uma das maiores franquias da Coca-Cola no país. Se engarrafar era difícil, imagine distribuir. “Na época, o setor de logística não passava de um estábulo com burros e carroças. Sem estradas que comportassem caminhões, usamos esses animais por anos”, lembra Ricardo. “Os burrinhos ficavam tão acostumados com o itinerário que paravam sozinhos diante das vendas e mercados e lá ficavam esperando até a carroça ser descarregada. Mesmo quando não havia entrega, o funcionário tinha que descer e fingir que tirava a carga da carroça. Só assim para enganar o animal e ele concordar em continuar seu caminho.” É por essas e por outras que para cumprir um roteiro de entregas de 300 quilômetros às vezes eram necessários vários dias de viagem.

“As dificuldades de transporte e estocagem mantiveram as gigantes americanas afastadas do Brasil por algum tempo, criando uma base consistente de consumidores para as pequenas indústrias regionais”, afirma Humberto Pandolpho, consultor de empresas no setor. Assim, não é de estranhar que o cantor e compositor mineiro Milton Nascimento só tenha tomado sua primeira Coca-Cola no Rio de Janeiro, a bordo de um avião da Pan Air, como ele afirma na música “Conversando no Bar”, de 1975. Mesmo ano em que, aliás, a palavra “refrigerante”, com o sentido de hoje, apareceu pela primeira vez no dicionário Aurélio.

É guerra!

O conteúdo era importante, mas as embalagens foram um fator decisivo na conquista territorial dos refrigerantes. Em 1934, nos Estados Unidos, a Pepsi deu um salto e tanto, dobrando o volume das garrafas de 170 para 350 mililitros sem mexer no preço. O resultado foi uma explosão de vendas quase sem alterar o custo de produção. A Coca reagiu, apostando em dois elementos importantes e até hoje indissociáveis da indústria dos refrigerantes: o design e a propaganda. Logotipos e slogans foram criados na velocidade em que se espalharam por pontos de venda, jornais e revistas. “Os refrigerantes tiveram grande influência no desenvolvimento da indústria da publicidade. Um exemplo, sempre citado nesse caso, é o uso do Papai Noel pela Coca-Cola”, diz o colecionador Geraldo Gayoso. “A empresa não inventou o Papai Noel, mas utilizou de forma tão maciça sua imagem que acabou imortalizando sua visão do personagem. Hoje ele é um senhor gorducho que se veste de vermelho graças às campanhas publicitárias da Coca-Cola”, diz Geraldo, reconhecido pela própria empresa como o quarto maior colecionador de produtos da marca no mundo.

A Coca foi pioneira em desenvolver garrafas exclusivas, acreditando que o desenho delas teria papel fundamental tanto para a rápida identificação da marca quanto para a fidelização dos clientes. “Enquanto as outras empresas utilizavam garrafas padronizadas, a Coca-Cola lançou um modelo exclusivo. O sucesso foi tamanho que a garrafa – cujo desenho, com pouquíssimas alterações, é mantido até hoje – foi apelidado de Mae West, a curvilínea estrela de Hollywood, símbolo sexual dos anos 30”, diz Geraldo.

Mas o grande salto da Coca-Cola foi durante a Segunda Guerra. Quando os Estados Unidos entraram no conflito, o lendário presidente da Coca, Robert Woodruff, garantiu que os soldados se sentiriam em casa onde quer que estivessem. Casa, para ele, significava poder comprar em qualquer lugar do mundo uma garrafa de Coca por 5 centavos de dólar. Onde não era possível enviar o produto engarrafado foram instalados kits manuais para misturar e envasar o refrigerante. Essas primeiras minifábricas do produto abriram caminho para o licenciamento de fabricantes de Coca-Cola pelo mundo afora, o que daria à empresa o porte de gigante multinacional e a fama de representar os interesses norte-americanos pelo mundo afora.

Na década de 1950 e nas duas décadas seguintes, a Coca e a Pepsi se tornariam símbolos do poder global dos americanos: armas da propaganda política, para o bem e para o mal, na época da Guerra Fria. Símbolo da sociedade de consumo, os refrigerantes se transformaram em pilares do american way of life, ou do jeito americano de ser. O que quer dizer que, ao lado das calças jeans e do rock’n’roll, viraram ícones de um mundo em que liberdade e consumo se equivaliam. E assim, na mesma medida em que a Coca-Cola e a Pepsi eram barradas no Leste Europeu, na União Soviética e na China, elas invadiram a Europa Ocidental, a Ásia e o Brasil.

A aceitação da Coca por aqui não foi imediata. “Antes de sua chegada, os refrigerantes eram vendidos em garrafas escuras e o líquido tinha sabores e cores reconhecíveis, como laranja e limão. Os brasileiros estranharam a cor escura da Coca-Cola, vendida em garrafas transparentes. A empresa realizou operações maciças de degustação para atrair o consumidor”, conta Ricardo Vontobel, da Vonpar. A Coca deu um novo sentido à produção em escala industrial, abrindo fábricas na cidade fluminense de São Cristóvão, no Rio de Janeiro e em São Paulo. Porto Alegre hospedou a primeira franquia da rede.

Nos anos 1950, houve o primeiro salto no consumo per capita de refrigerante no Brasil. E a primeira medida tomada pela indústria foi o aumento do volume das garrafas. As caçulinhas, garrafinhas de 180 mililitros, perderam espaço para as garrafas de 270 mililitros, que se tornaram a medida padrão nacional. Com a crescente urbanização do país e a chegada dos eletrodomésticos, incluindo as geladeiras, às casas de classe média, o próximo passo da indústria de refrigerantes foi óbvio: a criação das garrafas de 1 litro. Embora nunca tenha deixado de crescer, a outra grande explosão de consumo no Brasil só se daria nos anos 90. O Plano Collor pôs fim a diversas reservas de mercado e abriu a possibilidade de importação de máquinas a preços convidativos até para os pequenos fabricantes.

Isso numa época em que a grande novidade do ponto de vista tecnológico e de mercado era a garrafa one-way (ou não-retornável). A substituição do vidro pelo polietileno tereftalato, o PET, fez com que os vasilhames ficassem mais baratos e, mesmo em grandes formatos, descartáveis. Isso deu à indústria de refrigerantes, a partir dos anos 80 nos Estados Unidos e dos 90 no Brasil, um alcance quase ilimitado. Segundo a Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e Bebidas Não Alcoólicas, hoje são mais de 300 empresas fabricando refrigerantes no Brasil, com vendas totais da ordem de 12,2 bilhões de litros ao ano. No mundo, são 185 bilhões de litros, pouco mais de 30 litros por pessoa.

Com números como esses e pontos de venda que vão dos restaurantes luxuosos aos camelôs nos cruzamentos das grandes cidades, é impossível imaginar um dia sem pelo menos avistar uma latinha ou garrafa de refrigerante. Ele finalmente encontrou seu lugar e, no mundo todo, as pessoas abriram espaço em suas geladeiras para a enorme garrafa de água colorida, com sabor artificial e bolhas de gás.



Da rolha à Mae West
Imagem é tudo: pioneira no design inovador das garrafas, a Coca-Cola lançou modelos exclusivos

1894

Embora a tampinha coroa já existisse, a Coca-Cola foi vendida em garrafas com a rolha Hutchinson até 1902

1900

Com um desenho mais moderno, as garrafas vinham nas versões transparente e âmbar até 1916

1915

O modelo exclusivo – apelidado de Mae West por causa das curvas – fez sucesso e quase não mudou mais

1975

Nos Estados Unidos, a garrafa de plástico one-way com tampa de rosca foi testada já na década de 70.


Supertamanho
Celso Miranda
Em 30 anos, as famílias brasileiras diminuíram 44%. Já os refrigerantes triplicaram de volume

Eu cresci nos anos 1970, no Sumarezinho, em São Paulo. Colecionava figurinhas, adorava gibis do Pato Donald e, como os meninos de hoje, quando não estava na escola, estava jogando futebol. Fora os videogames, o acesso aos celulares e à internet, a grande diferença entre minha infância e a de hoje é que, na época, eu quase nunca bebia refrigerante. Em casa era raro, raríssimo, e a gente só tomava quando ia ao cinema com minha mãe ou ao clube com meu pai. Aí eu tomava Fanta Uva e meu irmão Sérgio, guaraná. Mas, mesmo de longe, eu os amava, tanto que colecionava tampinhas, que eu catava no chão, que nem doido, em todo lugar (lembro-me da tampa do refrigerante Minuano, que um amigo meu trouxe do Sul e que, até hoje, eu nunca tomei).

Não me lembro bem o porquê disso. Nunca perguntei para os meus pais. Mas me recordo de levar muita groselha com leite (argh!) no lanche da escola e tomar chá gelado e Q-Suco (pronuncia-se “quissuco”) no almoço. Não sei se os refris eram muito caros, ou talvez fosse o trabalho que dava. Pode parecer incrível dizer isso hoje em dia, mas não era tão simples comprar refrigerante nos anos 70, na maior cidade brasileira. Para comprar uma Coca grande (ou família, como se dizia), você tinha que levar uma garrafa vazia. E tinha que ser de Coca. Se só tivesse garrafa de Fanta, tinha que tomar Fanta. Então, a gente guardava tudo quanto é garrafa. Na minha casa, elas ficavam debaixo do tanque e eu achava nojento ir pegá-las, porque, dado seu conteúdo açucarado, não era raro haver baratas e outros insetos lá dentro. No supermercado, a necessidade de trocar vasilhames cheios por vazios fazia com que a gente ficasse na fila, geralmente do lado de fora das lojas, com uma sacola cheia de garrafas de vidro na mão. Para quem não tinha um casco (que era como a gente chamava a garrafa vazia), restava a opção de deixar um depósito. Funcionava assim: você ia à venda mais próxima e em vez de pagar, vamos supor, 1 cruzeiro (que era o dinheiro daquela época) pela Coca, pagava 3 (a relação era mais ou menos essa mesmo, ou seja, o casco era bem mais valioso que o conteúdo). Aí o vendedor lhe dava um papelzinho – que podia ser um pedaço daquele papel de seda de embrulhar pão, ou o verso em branco dos pacotes de cigarros – onde ele escrevia o valor do depósito (2 cruzeiros) e assinava. Eu achava o máximo, porque, no outro dia, se meu pai esquecesse, eu voltava e trocava o papelzinho por dinheiro. Chegando em casa, hora de procurar o abridor. Que nunca, nunca estava na mesma gaveta. Porém o que mais me intriga e o que permanece mais vivo na minha memória é que, depois de tudo isso, vencidos todos os percalços, a gente se sentava em volta da mesa, meu pai abria a garrafa de 1 litro e o conteúdo satisfazia quatro crianças e dois adultos. Hoje as famílias diminuíram e os refrigerantes cresceram. Não sei bem, mas talvez isso queira dizer alguma coisa, não é?


Saiba mais
Livros

Tono-Bungay, H.G. Wells, Penguin Classics, 2005 - A ponte entre as novelas cômicas e as novelas de idéias, tida pelo próprio Wells como seu mais ambicioso trabalho de ficção. Conta os primórdios da indústria de xaropes tonificantes nos Estados Unidos.

E o Outro Vacilou, Roger Enrico, Bertrand Brasil, 1986/89 - Um dos poucos livros publicados no Brasil sobre a “guerra da colas”.

Site

www.bevtech.com.br - Sobre colecionismo e curiosidades da indústria de refrigerantes.

Fonte:Superinteressante

terça-feira, 20 de julho de 2010

O espirro também é "atchim" em outros países?






















por Yuri Vasconcelos



Não. Cada língua tem uma forma própria de representar o som do espirro. Por exemplo, na França é atchoum, na Alemanha hatschi e nos Estados Unidos atchoo, achoo ou achew. Entre idiomas de um mesmo tronco lingüístico, como o português e o francês (derivados do latim), as onomatopéias do espirro podem ser similares. Mas isso não é uma regra. "Línguas do mesmo grupo podem ter representações bem distintas. As onomatopéias são formas espontâneas, que não se submetem totalmente aos sistemas fonológicos da língua", diz o lingüista Mário Viaro, da Universidade de São Paulo (USP). Já o modo como as pessoas "respondem" ao espirro varia muito, como você pode conferir ao lado. O atchim costuma ser provocado por uma irritação no nariz, na garganta, no pulmão ou nas vias aéreas superiores. Pode também ser uma defesa do organismo contra partículas invasoras, como poeira ou pólen – num espirro, o ar é expulso numa velocidade incrível: 150 km/h! E você já reparou como a maioria das pessoas involuntariamente fecha os olhos ao espirrar? Uma das razões é que, ao cerrarmos as pálpebras, reduzimos o risco de que as partículas expelidas entrem em contato com os olhos durante o atchim. Saúde! 8-)

O ESPIRRO E SUA "RESPOSTA" EM ALGUMAS LÍNGUAS

Em português: Atchim - Saúde!
Em inglês: Atchoo! - Deus te abençoe!
Em indonésio: Hatchi - Bendito seja Deus!
Em dinamarquês: Atju - Poderá beneficiar-te!
Em letão: Apci - Isso é para sua saúde!
Em romeno: Hapciu - Boa sorte


Fonte:Mundo estranho

segunda-feira, 19 de julho de 2010

O Segredo do Bonzo






























The Thinker -1881 Auguste Rodin




- Haveis de entender, começou ele, que a virtude e o saber, têm duas existências paralelas,
uma no sujeito que as possui, outra no espírito dos que o ouvem ou contemplam. Se
puserdes as mais sublimes virtudes e os mais profundos conhecimentos em um sujeito
solitário, remoto de todo contacto com outros homens, é como se eles não existissem. Os
frutos de uma laranjeira, se ninguém os gostar, valem tanto como as urzes e plantas bravias,
e, se ninguém os vir, não valem nada; ou, por outras palavras mais enérgicas, não há
espetáculo sem espectador.[...]



Fonte:
ASSIS, Machado de. Obra Completa. Rio de Janeiro : Nova Aguilar 1994. v. II.

sábado, 17 de julho de 2010

Série História da Animação – Parte I







Para compreender como começou a animação 3D, primeiramente temos de conhecer os primeiros desenhos animados e seus mais antigos representantes. Sem estes não poderíamos ter progredido na animação 3D.

Animação é a exibição rápida de uma sequência de imagens de 2D, 3D ou fotos de modelos reais (stop motion) para criar uma ilusão de movimento.

Os primeiros exemplos de tentativas de capturar o fenômeno do movimento de desenho podem ser encontrados no Paleolítico, nas pinturas rupestres, onde os animais são retratados com pernas múltiplas, clara tentativa de transmitir a percepção de movimento. Há também as pinturas das paredes egípcias, repletas de desenhos com poses variadas.

Em um dos exemplos mais famosos de Leonardo da Vinci, ele mostra como os membros ficariam em várias posições. Os anjos de Giotto parecem voar em seus movimentos repetitivos e os pergaminhos japonêses usados para contar histórias contínuas são os precursores desta arte que hoje conquistou o mundo.

Para que a animação fosse possível ser realizada, foi preciso saber um princípio fundamental do olho humano: a persistência da visão. Isso foi demonstrado pela primeira vez em 1828 pelo francês, Paul Roget, que inventou o taumatrópio – um disco com uma corda em baixo e em cima. Um lado do disco mostrou uma ave, e do outro a gaiola vazia, quando o disco girava, a ave aparecia na gaiola. Isso provou que o olho humano retém as imagens quando é exposto a uma série de retratos, um de cada vez.




continua..












Fonte:http://www.baloom.com.br/

Em busca da cidade bíblica

Pouco se sabe sobre a cidade de Jericó, descrita no Velho Testamento como a "Cidade das Palmeiras" e conhecida por ser o lugar do retorno dos israelitas da escravidão no Egito, liderados por Josué. Escavações descobriram 20 assentamentos, dos quais o primeiro data do ano 9000 a.C.














restos do palácio de Herodes

Por Sérgio Pereira Couto



O que foi a mítica cidade de Jericó? Muito do que sabemos veio da Bíblia, mais precisamente de Josué, no Velho Testamento. Poucos sabem que se trata de uma verdadeira cidade da Antiguidade que, embora não possua o glamour de uma civilização mediterrânea, tem o seu valor para um melhor entendimento da região do Oriente Médio.
No século XIX, acreditava-se que a agricultura havia se desenvolvido no Vale do Nilo em aproximadamente 4000 a.C. e teria ocorrido quase simultaneamente ao desenvolvimento da cerâmica. O Neolítico (um termo que significa "pedra nova") foi associado à invenção desta última atividade.

A partir dos primeiros trabalhos ocorridos no local, a arqueóloga britânica Kathleen Kenyon (1906-1978) percebeu que havia camadas mais profundas por baixo das já conhecidas, datadas da Idade do Bronze. Assim, a cada vez que suas próprias escavações se aprofundavam, ela encontrou depósitos que remontavam ao Neolítico, o que provava que o sítio arqueológico era mais antigo do que se pensava. Porém não foram descobertos restos de cerâmica nas camadas mais modernas, embora fossem mais profundas. Assim foram estabelecidos dois períodos para identificação dos restos encontrados: o Neolítico Pré-Cerâmica A (NPCA) e B (NPCB). A conclusão a qual Kenyon chegara era a de que, apesar da falta de cerâmica, as camadas encontradas eram de comunidades de fazendeiros.
Seria essa a Jericó da Bíblia? Essa foi a dúvida que estava na cabeça de todos quando as primeiras amostras retiradas das escavações da arqueóloga foram enviadas para a Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, onde a tecnologia do radiocarbono havia acabado de se tornar disponível. Os resultados foram especialmente surpreendentes para ela e sua equipe: as amostras remontavam a um período estimado entre 8000 e 7000 a.C., muito antes da data de 4000 a.C. conhecida. Jericó havia sido ocupada por pessoas que cultivavam grãos milhares de anos antes, remontando ao período entre 9000 e 7000 a.C. Essas datas logo foram confirmadas por leituras de outros sítios arqueológicos e as escavações de Kenyon estabeleceram o começo da história da agricultura.




Muralhas e Mortos















Vista aérea do sítio arqueológico de Jericó




Apesar das provas que mudavam a concepção histórica sobre o início da atividade agricultural, os prédios da antiga Jericó e seus conteúdos foram ainda mais surpreendentes. Construções na quantidade descoberta pelos arqueólogos era algo completamente sem precedentes numa era tão longínqua. A camada do NPCA era cercada por um trincheira larga cavada no leito de pedra e uma muralha com aproximadamente 3,66 metros de altura e 2,74 metros de largura. Essa construção era complementada por uma torre de aproximadamente 7,62 metros de altura, feita de pedra talhada com uma escadaria interna que levava a um terraço plano.
O objetivo dessa torre e da muralha é discutido até hoje. Kenyon pensou se tratar de medidas defensivas, mas teorias mais recentes sugerem que se assim fosse, teriam como meta proteger o vilarejo de inundações e deslizamentos de terra e não de ataques de inimigos.


A área no interior das muralhas é grande e poderia conter cerca de 500 pessoas em qualquer período. As casas eram construídas com pedras ou tijolos de argila, eram redondas e parcialmente abaixo do solo. Na próxima camada, pertencente ao NPCB, as casas mudaram para o formato retangular, mas mantiveram os pisos de argamassa. Porém, as do NPCB eram polidas e pintadas.
Outro detalhe que chamou a atenção dos arqueólogos foi que os habitantes de Jericó do NPCB viviam literalmente com seus mortos. Kenyon foi capaz de escavar cerca de um décimo de toda a área, mas encontrou cerca de 276 buracos usados em enterros e todos eles eram associados às construções da cidade. Estavam nos pisos, entre as paredes, sobre as estruturas das casas e mesmo dentro da já citada torre. Poucos eram acompanhados por artefatos, mas muitos deles, principalmente os que continham corpos de adultos, não tinham os crânios, que eram enterrados em separado.

Grupos de crânios decorados foram identificados como sendo do período NPCB. Sete estavam em um único buraco, alguns estavam em casas e outros ainda sobre os pisos pintados e polidos. Suas faces foram modeladas com aplicações de gesso sobre os ossos e muitos não possuíam as mandíbulas, uma indicação de que podem ter sido colocados como decoração cerimonial depois de anos enterrados.
Por vezes moluscos eram colocados no lugar dos olhos e havia traços de outras decorações no gesso de alguns deles, que poderia ser para desenhar bigodes. Alguns dos crânios encontrados pareciam ter sido enterrados novamente enquanto outros eram conservados para mostrar nas casas, junto dos demais ossos que estavam nos buracos encontrados. Eram preparados com muito cuidado e a maioria dos crânios está em excelentes condições de preservação, o que indica que poderiam fazer parte de algum culto aos antepassados.

Períodos

Por fim, resta falar um pouco sobre o que se conhece dos períodos históricos de Jericó. O primeiro assentamento foi seguido por um (por volta de 6800 a.C.) que os arqueólogos dizem ser de um povo que teria absorvido os habitantes originais para dentro da cultura então predominante. Na metade final da Idade do Bronze Médio (por volta de 1700 a.C), a cidade já tinha prosperidade o suficiente para ter seus muros expandidos e reforçados. Foi destruída por volta de 1550 a.C., e o local ficou abandonado até ser reutilizado no século IX a.C.
Pouco depois, houve uma invasão assíria, seguida por uma babilônica. Jericó ficou novamente sem habitantes entre 586 e 538 a.C., perío do do exílio babilônico. O rei persa Ciro, o Grande, refundou a cidade distante um quilômetro e meio a sudeste do seu local histórico no monte Tell es-Sultan.

Sob domínio persa a cidade foi um centro administrativo e serviu como sede para Alexandre, o Grande, após sua conquista da região entre 336 e 323 a.C. Passou para o domínio helênico em meados do século II a.C. e foi arrendada por Herodes de Cleópatra, após a rainha egípcia tê-la recebido como presente de Marco Antônio.
Após a queda de Jerusalém pelo exército de Vespasiano em 70 d.C., Jericó declinou rapidamente, e apenas em 100 d.C. a cidade foi uma pequena guarnição romana. Outros períodos se seguiram, mas o mistério sobre quem seriam seus primeiros habitantes, bem como seus hábitos tão peculiares, ainda persiste até que novas evidências sejam descobertas.


























Fonte: leituras da História

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Significado ainda presente

Há mais de 150 anos, Lewis Carroll publicou os livros Alice no país das maravilhas e Alice no país dos espelhos.




























Por Suely Gevertz


Atualmente, encontra-se em cartaz um filme dirigido por Tim Burton e duas edições sobre as obras de Lewis Carroll estão nas livrarias. Uma da Editora Jorge Zahar, que contém as duas histórias de Alice e outra da Editora Cosac Naify, com Alice no país das maravilhas. O que será que mantém esta história viva até os dias de hoje?

Nesta coluna, escreverei somente sobre Alice no país das maravilhas, na edição da Editora Cosac Naify. O livro conta a história das aventuras de Alice ao cair numa toca de coelho, levando-a a um lugar povoado por criaturas fantásticas que misturam características humanas e fantásticas que lhe apresentam enigmas. Possui as belíssimas ilustrações de Luiz Zerbini e a tradução de Nicolau Sevcenko, historiador e professor da Universidade de Harvard e da Universidade de São Paulo (USP), para quem Alice no país das maravilhas é: “A melhor lição de ética, de irreverência e de inconformismo, tanto para crianças quanto para adultos.” O tradutor assina também um posfácio exclusivo, contextualizando o período vitoriano em que o livro foi escrito e a crítica à sociedade implícita na narrativa de Carroll. O artista plástico paulista Luiz Zerbini criou cenários feitos de cartas de baralho das quais saltam os personagens, por meio de recortes. Suas ilustrações são repletas de lembranças lúdicas e, ao mesmo tempo, desconcertantes, colaborando com o clima de energia alucinante e hipnótica do livro.

Experiência onírica

O livro apresenta um mundo atravessado de irracionalidade, de situações absurdas e de diálogos desconcertantes. Alice é uma estrangeira no país das maravilhas. Quando Alice se defronta com uma situação de prepotência ou desrespeito, imediatamente o enfrenta de igual para igual, como uma criança, sem medo. Diferentemente de outros momentos em que se vê sozinha, em situações que não entende o sentido. A maioria dos personagens do livro apresenta à Alice situações inéditas para ela, que tenta recorrer à imagem de seu bicho de estimação, um gatinho que, segundo ela, se estivesse presente no momento, saberia como lidar com o momento que está vivendo. São personagens assustadores, inéditos, com características humanas, que sofrem, tem alegrias e receios. A rainha de Copas tem um peculiar senso de justiça, dando punição antes mesmo de um julgamento, por exemplo, o que pode representar pessoas que participaram de toda a história da humanidade até os dias de hoje: pessoas que julgam antes de saber.

O livro inicia-se numa situação que, creio, todas as pessoas vivem: num dia quente, sem nada para fazer, entediada com aquilo que está fazendo, Alice parece entrar em um estado de devaneio. Segue um coelho que tira um relógio do bolso de seu colete e cai num buraco. É frequente a experiência onírica de cair num buraco. E, do meu ponto de vista, o devaneio dá um possível sentido ao livro e de sua permanência ao longo do tempo. Alice no país das maravilhas descreve ao longo de sua história, o que Freud formulou como a formação dos sonhos. Todas as formulações feitas por Freud sobre a formação de sonhos estão presentes no livro: deslocamento, condensação, transformação de afetos em seus contrários (amor aparecendo como ódio, por exemplo), figurabilidade.

Formação de sonhos

Como uma criança, Alice mostrase assombrada com tudo o que vê. Mas, não é o mesmo que as pessoas demonstram frente a muitos de seus sonhos, vividos em estado de sono ou em vigília (devaneios)? Ou quando se defrontam com sentimentos, reações e ações inusitadas? Não se reconhece nesses momentos. Em sonhos, todos os objetos, animais e pessoas podem aparecer como inéditas, como um coelho usando relógio. Crescer e diminuir podem ser possíveis nos sonhos. Uma rainha irracional, com julgamentos não baseados na realidade que vive. Enfim, todos os personagens de Carroll apresentam-se regidos pelos métodos conhecidos pela Psicanálise ao estudar o mecanismo realizado pela mente na formação de sonhos. Ao lembrar-se de sonhos, muitas pessoas vivem uma sensação de estranhamento. Isso ocorre também em situações experienciadas durante um processo psicanalítico ao se defrontarem com aspectos desconhecidos de sua vida mental. E essas experiências também se apresentam sem sentido, muitas vezes. A Psicanálise também diz que os mecanismos de formação de sonhos são os mesmo que a mente utiliza para dar conta das emoções que se vive.

Do meu ponto de vista, um dos motivos desta obra ter persistido no tempo é por ela trazer a possibilidade de identificação daquilo que todas as pessoas têm: a mente e seu funcionamento. E a mente tem como função dar significado as experiências vividas, dando um sentido a elas e ao viver. Como Alice no país das maravilhas.



Suely Gevertz é psicóloga Clínica e psicanalista. Professora no Instituto Sedes Sapientiae, de São Paulo, e do curso Psicanálise para formação de Psicoterapeutas, do Setor de Psicoterapia do Departamento de Psiquiatria da UNIFESP / Escola Paulista de Medicina. E-mail: sgevertz@gmail.com

sábado, 10 de julho de 2010

Os Santos mais roubados nas Igrejas

Por Ulisses Campbell
































1.São José (18 imagens desaparecidas)
é um dos santos mais populares da Igreja católica. Sessenta municípios brasileiros carregam seu nome.
Por isso também é frequente nos altares. Casado com a Virgem Maria, é padroeiro dos carpinterios, usa barba e está sempre com feição dócil de bom pai.































2.Sra do Rosário (17 imagens desaparecidas)
Tornou-se popular depis que frades dominicanos instituiram a oração do rosário,na Idade Média. Para cultuá-la, o devoto reza 150 ave-marias.
É a padroeira dos negros. Durante a escravidão, foram eles que construíram a primeira igreja em sua homenagem.



































3.São Pedro ( 12 imagens desaparecidas)
É um dos santos mas importantes do catolicismo: foi um dos 12 apóstolos e ajudou a fundar a Igreja. Por isso também é um dos mais frequentes nos altares. É padroeiro dos próprios padres ( fale essa frase rápido) Morreu martirizado e pediu para ser crucificado de cabeça para baixo.
































4. São Benedito (10 imagens desaparecidas)

Santo negro era filho de escravos, na Itália. Roubava comida dos conventos para alimentar os famintos. reza a lenda que, quando era flagrado escondendo alimentos sob a roupa, a comida se transformava em flores. Por isso suas imagens sem tem flores nas mãos.







































5. Sra dos remédios (9 imagens desaparecidas)
Ajudou a fundar hospitais na África e no Oriente Médio.
é uma espécie de multiuso das santas, é procurada por pessoas desenganadas pela medicina, por naúfragos, por marinheiros em alto mar, e por pessoas com dificuldades financeiras.
































6.Sra da Conceição (8 imagens desaparecidas)
É a concepção da Virgem Maria sem o pecado original. Pelo menos 118 municípios decretaram feriado no dia 8 de dezembro em homenagem a ela. Em1717, uma imagem de Conceição aparece o ro Paraíba e virou padroeira nacional, Sra de Aparecida.































7.Menino Jesus (7 imagens desaparecidas)
É a imagem de Jesus cristo ainda criança. acompanhado da mãe. Em quanse todas as santas, o filho de desu é esculpido separadamente e encaixado na peça principal. Os ladrões de igreja optam por roubar somente uma pequena imagem quando não conseguem levar a mãe junto.




"E destruirei do meio de ti as tuas imagens de escultura e as tuas estátuas; e tu não te inclinarás mais diante da obra das tuas mãos".
Miquéias 5:13



"Eu sou o SENHOR; este é o meu nome; a minha glória, pois, a outrem não darei, nem o meu louvor às imagens de escultura".
Isaías 42:8




"Confundidos sejam todos os que servem imagens de escultura, que se gloriam de ídolos; prostrai-vos diante dele todos os deuses".
Salmos 97:7
Fonte: Superinteressante

sábado, 3 de julho de 2010

A criação de Crepúsculo





Recebi uma tonelada de perguntas sobre como criei a história de Crepúsculo e como consegui publicá-la. Pode ser que eu acabe com minha página de FAQ, mas aqui está a história completa:


(Advertência 1: existem referências a várias passagens de Crepúsculo no que se segue; se não quiser estragar o suspense, pare de ler... agora. Advertência 2: Como pode ter imaginado pelo tamanho de meu livro, eu não consigo contar uma história curta... Isso vai levar algum tempo. Agora estão avisados.)

A Redação: Sei exatamente a data em que comecei a escrever Crepúsculo, porque também foi o primeiro dia das aulas de natação de meus filhos. Então posso dizer sem dúvida nenhuma que tudo começou em 2 de junho de 2003. Até essa altura, eu não tinha escrito nada além de alguns capítulos (de outras histórias) que nunca levei adiante, e absolutamente nada desde o nascimento de meu primeiro filho, seis anos antes.

Eu acordei (naquele 2 de junho) de um sonho muito nítido. Em meu sonho, duas pessoas tinham uma conversa intensa numa campina no bosque. Uma das pessoas era uma menina comum. A outra era incrivelmente bonita, faiscava e era um vampiro. Eles discutiam as dificuldades inerentes aos fatos de que: A) eles estavam apaixonados um pelo outro; e B) o vampiro sentia-se particularmente atraído pelo cheiro do sangue da menina e tinha dificuldades para se conter e não matá-la imediatamente. (Para o que é essencialmente uma transcrição de meu sonho, veja por favor o Capítulo 13 do livro: "Confissões").

Embora eu tivesse milhões de coisas para fazer (isto é, preparar o café-da-manhã para as crianças famintas, vestir e trocar suas fraldas, encontrar os trajes de banho que ninguém jamais colocava no lugar certo etc.), continuei na cama, pensando no sonho. Fiquei tão intrigada com a história do casal sem nome que odiei a idéia de me esquecer daquilo; era o tipo de sonho que lhe dá vontade de ligar para uma amiga e encher a paciência dela com uma descrição detalhada. (Além disso, o vampiro era tão tremendamente bonito que eu não queria perder a imagem mental.) De má vontade, por fim me levantei e resolvi o que era imediato, depois adiei tudo o que podia e me sentei ao computador para escrever - algo que eu não fazia havia tanto tempo que me perguntei por que estava me dando aquele trabalho. Mas eu não queria perder o sonho, então digitei o máximo do que lembrava, chamando os personagens de "ele" e "ela".

Desse ponto em diante, não se passou um dia sem que eu não escrevesse alguma coisa. Nos dias ruins, só digitava uma ou duas páginas; nos dias bons, terminava um capítulo e, mais tarde, outros. Escrevia principalmente à noite, depois que as crianças estavam dormindo, para poder me concentrar por mais de cinco minutos sem ser interrompida. Comecei pela cena na campina e escrevi dali para o final. Depois voltei ao início e escrevi até que as peças se encaixassem. Cheguei ao "fio" que os unia no final de agosto, três meses depois.

Levei algum tempo para batizar a dupla anônima. Para meu vampiro (por quem eu me apaixonei desde o primeiro dia) decidi usar um nome que antigamente era considerado romântico, mas tinha perdido popularidade havia décadas. O Sr. Rochester, de Charlotte Brönte, e o Sr. Ferrars, de Jane Austen, foram os personagens que me levaram a lhe dar o nome de Edward. Experimentei seu formato e descobri que combinava. Minha protagonista foi mais complicada. Nenhum nome que lhe dava parecia correto. Depois de passar muito tempo com ela, eu a amava como a uma filha e nenhum nome era bom. Por fim, inspirada por esse amor, dei-lhe o nome que estava poupando para minha filha, que nunca veio e era improvável que, aquela altura, aparecesse: Isabella. Ufa! Edward e Bella foram batizados. Para os demais personagens, fiz muita pesquisa em antigos registros de recenseamento, procurando por nomes populares na época em que eles nasceram. Algumas trivialidades: Rosalie originalmente era "Carol" e Jasper era, no começo, "Ronald". Gosto muito mais dos nomes novos, mas de vez em quando tenho um lapso e digito Carol ou Ron por acaso. Isso confunde as pessoas que lêem meus originais.

Para a ambientação, sabia que precisava de um lugar ridiculamente chuvoso. Recorri ao Google, como faço quando preciso pesquisar, e procurei pelo lugar com o maior índice pluviométrico dos Estados Unidos. Por acaso era a Península de Olympic, no estado de Washington. Consegui mapas da região e os examinei, procurando por algo pequeno, fora de mão, cercado pela floresta... E lá estava, bem onde eu queria, uma cidadezinha chamada "Forks". Eu mesma não poderia ter escolhido um nome mais perfeito. Fiz uma busca por imagens da região no Google e, se o nome já não tivesse me agradado, as lindas fotos teriam conseguido isso. (Imagens como a da Floresta Hoh - a uma curta viagem de Forks. Ver também forksweb.com. Ao procurar Forks, encontrei a Reserva La Push, lar da tribo quileute. A história dos quileutes é fascinante e alguns membros fictícios da tribo rapidamente tornaram-se essenciais ao livro.

Em todo esse tempo, Bella e Edward eram, bem literalmente, vozes em minha cabeça. Eles simplesmente não calavam a boca. Eu ficava acordada até tarde, ao máximo que podia, tentando colocar no computador tudo que havia em minha mente e depois me arrastava, exausta, para a cama (meu bebê ainda não estava dormindo a noite toda) e acabava começando outra conversa em minha cabeça. Eu odiaria perder tudo por esquecimento, então me levantava e voltava ao computador. Por fim, levei uma caneta e um caderno para minha mesa de cabeceira para tomar notas, assim poderia dormir um pouco. Era sempre um desafio empolgante, de manhã, tentar decifrar os garranchos que tinha feito no escuro.

Durante o dia também não conseguia me afastar do computador. Quando estava presa nas aulas de natação, sob um sol de 46 graus em Phoenix, eu bolava a trama e voltava para casa com tanta coisa nova que não conseguia digitar com rapidez suficiente. Era nosso típico verão no Arizona, quente, ensolarado, quente, ensolarado e quente, mas, quando penso naquelas três meses, lembro-me da chuva e de coisas verdes e frias, como se eu realmente tivesse passado o verão na floresta de Olympic.

Quando terminei o corpo do romance, comecei a escrever epílogos... muitos epílogos. Isso enfim me deu a dica de que eu não estava pronta para abandonar meus personagens, e comecei a escrever uma seqüência. Enquanto isso, continuei a editar Crepúsculo de uma forma totalmente obsessivo-compulsiva.

Minha irmã mais velha, Emily, era a única que sabia realmente o que eu andava aprontando. Em junho, comecei a lhe mandar os capítulos à medida que os concluía, e ela logo se transformou em minha torcida. Ela sempre me procurava para saber se eu tinha alguma coisa nova. Foi Emily quem sugeriu, depois que terminei, que eu devia tentar publicarCrepúsculo. Eu estava tão pasma com o fato de realmente ter terminado um livro inteirinho que decidi investigar.

A Publicação: Para não dizer coisa pior, eu era ingênua a respeito da publicação de um livro. Pensei que funcionasse assim: você imprimia uma cópia do romance, embrulhava em papel pardo e mandava a uma editora. Rá, rá, rá, essa é boa. Comecei pelo Google (naturalmente) e comecei também a descobrir que não era assim que se fazia. (Os filmes mentem para nós! Por quê?! Uma observação: você não vai gostar da nova versão de Steve Martin de Doze é demais quando souber como o cenário editorial que está no filme é insanamente improvável). Ficava tremendamente intimidade com todo o esquema de solicitações por carta, agentes literários, acordos simultâneos ou de exclusividade, sinopses etc., e aquela altura eu quase desisti. Certamente o que me fez continuar não foi a fé em meu fabuloso talento; acho que era só porque amava tanto meus personagens, e eles eram tão reais para mim, que eu queria que outras pessoas os conhecessem também.

Submeti os originais ao WritersMarket.com e compilei uma lista de pequenas editoras que aceitavam originais não solicitados e algumas agências literárias. Foi por volta dessa época que minha irmã mais nova, Heidi, falou no website de Janet Evanovich. Em sua seção de perguntas e respostas para escritores, Janet E. mencionava a Writers House, entre outras, como o que havia de melhor no mundo das agências literárias. A Writers House foi para minha lista como a mais desejável e também a menos provável.

Mandei umas quinze solicitações (e ainda sinto um aperto no estômago quando passo pela caixa de correio onde coloquei minhas cartas - foi apavorante postá-las). Preciso dizer, para que fique registrado, que minhas solicitações eram verdadeiramente chatas e não culpo ninguém que me mandou uma carta de rejeição (recebi umas sete ou oito delas. Ainda as tenho também). A única rejeição que realmente magoou veio de um pequeno agente que só leu o primeiro capítulo antes de me massacrar. A rejeição mais maldosa chegou depois que a Little, Brown me selecionou para um contrato de três livros, então não me incomodou em nada. Tenho que admitir que pensei em devolver uma cópia dessa recusa grampeada à reportagem sobre meu contrato na Publisher's Weekly, mas fui superior a isso.

Minha guinada veio na forma de uma assistente da Writers House chamada Genevieve. Só muito mais tarde é que fui descobrir a sorte que tive; por acaso, Gen não sabia que 130 mil palavras correspondem a um monte de palavras. Se ela soubesse que 130 mil palavras equivaliam a 500 páginas, provavelmente não teria pedido para ver. Mas ela não sabia (pode me imaginar enxugando o suor da testa) e pediu mesmo os três primeiros capítulos. Fiquei emocionada por obter uma resposta positiva, mas também um pouco preocupada, porque sentia que o início do livro não era a parte mais forte. Mandei pelo correio aqueles três capítulos e recebi uma carta algumas semanas depois (minhas mãos estavam tão fracas de medo que mal conseguia abri-la,). Era uma carta muito gentil. Ela sublinhara duas vezes à caneta a parte em que digitou como havia gostado dos três primeiros capítulos (eu ainda tenho a carta, é claro) e me pedia os originais completos. Foi nesse exato momento que percebi que podia realmente ver Crepúsculo impresso, e foi um dos momentos mais felizes de toda minha vida. Eu gritei muito.

Mais ou menos um mês depois de ter mandado os originais, recebi um telefonema de Jodi Reamer, uma agente literária muito sincera, que queria representar meu livro. Tentei realmente parecer profissional e adulta durante a conversa, mas não tenho certeza de tê-la enganado. Outra vez minha sorte era enorme (e eu não costumo ter sorte - nunca na minha vida ganhei nada, nem mesmo consigo pegar um peixe quando estou no barco) porque Jodi é uma superagente. Eu não podia ter terminado em melhores mãos. Ela é parte advogada, parte ninja (agora está se dedicando para obter a faixa preta, e não estou brincando), uma editora de texto maravilhosa e uma grande amiga.

Jodi e eu trabalhamos por duas semanas para colocar Crepúsculo em forma antes de mandar às editoras. A primeira coisa em que trabalhamos foi o título, que no início eraForks (e eu ainda tinha uma quedinha pelo nome). Depois, aparamos algumas arestas e Jodi mandou o livro a nove editoras diferentes. Isso acabou com minha capacidade de dormir, mas por sorte eu não fiquei em suspense por muito tempo.

Megan Tinley, da Megan Tinley Books, da Little, Brown and Company, leu Crepúsculoenquanto atravessava o país de avião e devolveu a Jodi um dia depois do fim de semana de Ação de Graças com um contrato de direitos autorais tão imenso que eu sinceramente pensei que Jodi estivesse me fazendo de boba - em especial pela parte em que ela rejeitava a oferta da agente e propunha mais. Ao final do dia, o resultado foi terminar tentando processar a informação de que não só meu livro seria publicado por uma das maiores editoras de livros para jovens adultos do país, mas também que eles iam me pagar por isso. Por um bom tempo, fiquei convencida de que era uma pegadinha muito cruel, mas eu não podia imaginar quem chegaria a tal ponto: pregar uma peça em uma dona-de-casa tão insignificante como eu.

E foi assim, ao longo de seis meses, que Crepúsculo foi sonhado, escrito e aceito para publicação.

As coisas ainda estão uma loucura, com o contrato para o cinema e toda a atenção pré-publicação que Crepúsculo continua a receber. Embora de vez em quando eu fique impaciente, estou feliz porque tive os últimos dois anos para tentar me entender com essa situação. Estou muito ansiosa para finalmente ver Crepúsculo nas prateleiras, e também bastante assustada. No geral, foi um verdadeiro trabalho de amor, amor por Edward e Bella e por todos os outros amigos imaginários, e estou emocionada porque agora outras pessoas poderão conhecê-los.

[Reproduzido de StephenieMeyer.com]

Ps: eu estou no Crepúsculo ainda, ou seja o 1º da saga!