terça-feira, 31 de agosto de 2010

Janice e o umbigo

Veronica Stigger



















Janice vivia enamorada de seu umbigo. Não fazia muito tempo que havia dispensado dois gêmeos fortes, másculos e apaixonados para poder ficar sozinha consigo mesma e apreciar – sem uma alma para lhe roubar a paciência e o bom humor – aquele buraquinho perfeitamente bem delineado de sua barriga.



No início, era em frente ao espelho, com uma mão a arriar a calça e a outra a levantar a blusa próxima aos seios, que a moçoila se desmanchava em elogios. Que umbiguinho divino!, gabava-se para si mesma. Que curvas primorosas! Que coisinha mais magnífica! E assim sobrevinham que issos e que aquilos até chegar a noite.



Numa sexta-feira, ao olhar para baixo casualmente, percebeu que poderia enxergar muito mais detalhes de sua obra-prima natural se a admirasse diretamente, sem mediação. Foi o fim do espelho e o início do torcicolo. Janice encurvava-se cada vez mais para aproximar seu rosto do umbigo. Aos poucos, sua coluna foi se transformando num arco. Janice já não era mais capaz de ficar novamente ereta: levava as semanas, os meses, os anos enroscada em si mesma, apaixonada que estava por seu buraquinho.



Numa outra sexta-feira, ao tentar ajeitar suas costas arqueadas, tocou sem querer os lábios em sua barriga. Muitíssimo feliz com a nova possibilidade, repetiu infinitamente o mesmo gesto. Impulsionava o tronco para frente e beijava seu umbigo. Beijava e beijava e ria satisfeita. Dos beijos, passou às lambidas. Gastava horas lavando seu umbigo com cuspe.

Numa terceira sexta-feira, de súbito, prendeu sua língua num buraco aberto pela acidez de sua saliva. Mesmo assustada, Janice amou a novidade. Com o transcorrer dos dias, das semanas, dos anos, o buraco tornou-se gradativamente maior: penetrava nele não só a língua, mas também a boca e o nariz.



Numa derradeira sexta-feira, Janice trancou as orelhas no seu umbigo. Ao invés de tentar tirá-las, introduziu-as ainda mais, arrombando de vez seu buraquinho. De repente, zupt!, foi-se a cabeça de Janice para dentro de sua barriga. Extasiada, forçou ainda mais a passagem. Os ombros entraram com uma certa dificuldade. Depois deles, o buraco se distendeu, facilitando o ingresso do resto de seu corpo. Os braços, o peito, as pernas, os pés submergiram em Janice como água escorrendo pelo ralo. O último a sumir foi o piercing.
Hoje, Janice vive feliz, inteira dentro de seu umbigo.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Arqueólogos descobriram o maior rato que já viveu: e ele pesava cerca de 6 quilos



















Você já imaginou um rato do tamanho de um gato? Foi precisamente isso que arqueólogos encontraram em uma caverna no leste da Indonésia.

As escavações revelaram, além do “rato Hulk”, mais 11 novas espécies de roedores. Oito desses “ratos” pesavam mais do que um quilo. Já imaginou uma infestação desses “camundongos” na sua cozinha?
























Segundo Kem Aplin, um dos arqueólogos responsáveis pela descoberta, os roedores constituem 40% dos mamíferos no mundo todo e são uma importante parte do ecossistema. Manter a biodiversidade entre ratos seria tão importante quando proteger as baleias.

A datação por carbono mostra que esses ratos gigantes viveram até 2mil anos atrás. Pessoas que viveram nas ilhas da Indonésia há 40 mil anos, caçavam e se alimentavam com a carne desses animais. Isso mostra que a ilha tinha um balanço ecológico até 2mil anos atrás, quando os ratos entraram em extinção por consumo desenfreado. [Science Daily]




























Nota:eu e esses bichanos, não ocupamos definitivamente o mesmo lugar no espaço!

domingo, 1 de agosto de 2010

Televisão
















A invenção que mudou tudo foi a televisão. Foi o primeiro avanço tecnológico de importância histórica mundial no pós-guerra. Com a TV dava-se um salto qualitativo no poder das comunicações de massa. O rádio já se revelara, nos anos de guerra e no período entre guerras, um instrumento muito mais poderoso de conquista social do que a imprensa (...). A capacidade da televisão de exigir a atenção do público é incomensuravelmente maior, porque não se trata meramente de audiência: o olho é atingido antes de se aprumar o ouvido. O que o novo veículo trouxe foi uma combinação de poder sequer sonhada: a contínua disponibilidade do rádio com um equivalente ao monopólio perceptivo da palavra impressa, que exclui outras formas de atenção do leitor. A saturação do imaginário é de outra ordem.





O verdadeiro momento de (...) ascendência [da TV] só veio com a chegada da televisão em cores, que se generalizou no Ocidente no início dos anos 70, desencadeando uma crise na indústria cinematográfica, que ainda sofre os efeitos nas bilheterias. Se há um isolado divisor de águas tecnológico do pós-modernismo, ei-lo. Se compararmos o cenário que criou àquele do início do século, a diferença pode ser captada de forma bem simples. Outrora, em júbilo ou alarmado, o modernismo era tomado por imagens de máquinas; agora, o pós-modernismo é dominado por máquinas de imagens. (...) as máquinas despejam uma torrente de imagens com cujo volume nenhuma arte pode competir. O ambiente técnico decisivo do pós-moderno é constituído por essas cataratas de tagarelice visual. Desde os anos 70, a disseminação de instrumentos e posicionamentos de segunda ordem em boa parte da prática estética só é compreensível em termos dessa realidade primordial. Mas esta, claro, não é simplesmente uma onda de imagens, mas também – e acima de tudo – de mensagens. (...) Os novos aparelhos (...) são máquinas de perpétua emoção, transmitindo discursos que são ideologia emparedada, no sentido forte do termo. A atmosfera intelectual do pós-modernismo, de doutrina mais do que arte, tira muito do seu ímpeto da pressão dessa esfera. Porque o pós-moderno é também isto: um índice de mudança crítica na relação entre tecnologia avançada e o imaginário popular.



ANDERSON, Perry. As origens da pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999, p.104-105.

Industrial cultural























(...) Eis por que o estilo da indústria cultural, que não tem mais de se pôr à prova em nenhum material refratário, é ao mesmo tempo a negação do estilo. A reconciliação do universal e do particular, da regra e da pretensão específica do objeto, que é a única coisa que pode dar substância ao estilo, é vazia, porque não chega mais a haver uma tensão entre os pólos: os extremos que se tocam passaram a uma turva identidade, o universal pode substituir o particular e vice-versa.





(...) Os grandes artistas jamais foram aqueles que encarnaram o estilo da maneira mais íntegra e mais perfeita, mas aqueles que acolheram o estilo em sua obra como uma atitude dura contra a expressão caótica do sofrimento, como verdade negativa.



(...) O elemento graças ao qual a obra de arte transcende a realidade, de fato, é inseparável do estilo. Contudo, ele não consiste na realização da harmonia – a unidade problemática da forma e do conteúdo, do interior e do exterior, do indivíduo e da sociedade –, mas nos traços em que aparece a discrepância, no necessário fracasso do esforço apaixonado em busca da identidade. Ao invés de se expor a esse fracasso, no qual o estilo da grande obra de arte sempre se negou, a obra medíocre sempre se ateve à semelhança com outras, isto é, ao sucedâneo da identidade. A indústria cultural acaba por colocar a imitação como algo de absoluto. Reduzida ao estilo, ela trai seu segredo, a obediência à hierarquia social. A barbárie estética consuma hoje a ameaça que sempre pairou sobre as criações do espírito desde que foram reunidas e neutralizadas a título de cultura. Falar em cultura sempre foi contrário à cultura. O denominador comum 'cultura' já contém virtualmente o levantamento estatístico, a catalogação, a classificação que introduz a cultura no domínio da administração.



ADORNO, Theodor & HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985, p. 122 e 123.

A arte e sua relação com o espaço público















Igreja São Benedito sd republica




Hoje, dentro das mais diversas comunidades deste país, produzimos conhecimento sobre arte, construímos escolas de arte e nos organizamos em grupos que atuam realizando exposições e desenvolvendo uma imensa gama de atividades relacionadas com a arte. Todo esse processo alimenta-se de um vasto conhecimento acumulado, uma série de práticas, conceitos e visões acerca do que seja arte, do valor estético de determinadas produções artísticas, entre outros aspectos que cuidamos em transmitir para os alunos. Porém, é curioso notar que aquilo que mais interessa na arte não é o que já temos na conta de algo consolidado, mas, ao contrário, é o que ela carrega e promove de incerteza, de estranhamento. No campo da arte, isso não só é natural, como também é o motor dela mesma, e é um erro que isso não seja encarado desse modo!



Assim, na qualidade de professor, procuro o tempo todo transmitir ao aluno que as formulações apresentadas são formulações, e não verdades absolutas. Alerto-os para o fato de que será sempre preciso deixar espaço para outra leitura, aquela leitura que não possuo. Naturalmente, é preciso também esclarecer que toda a produção artística, assim como qualquer objeto produzido pelo homem, está inscrita na história. Portanto, também não é o caso de se pensar que não haja objetividade possível no discurso sobre arte. É necessário que o aluno saiba da genealogia, por exemplo, de uma obra qualquer que se resolva analisar, como também é fundamental que ele seja informado do campo de referências teóricas utilizadas na abordagem dessa mesma obra. É dever do professor, quando fala, comenta ou julga alguma coisa, apresentar o lugar teórico de onde ele fala, comenta e julga. Dito de uma outra maneira, é dever do professor jamais esquecer aqueles dois versos do Fernando Pessoa: O que em mim sente está pensando e Não sou eu quem descrevo, eu sou a tela e oculta mão colore alguém em mim. Essa posição parece-me essencial para a formação de alunos abertos a novas possibilidades e que se sintam à vontade para pensar novas relações. (...)



O que importa é despertar o aluno para essa riqueza que o mundo tem e para a riqueza que pode ter a relação dele com o mundo. Nesse sentido, a cidade é o maior exercício que temos. Na cidade, há uma proliferação de matérias. É uma memória ao mesmo tempo individual e coletiva porque os espaços falam de nós. (...)



A arte é, talvez, a última possibilidade deste mundo tão opaco. E está rigorosamente nas mãos de quem trabalha com educação fazer com que os alunos que estão se formando percebam a infinidade de coisas que compõem o mundo. Entendê-lo como sendo um elenco de imagens gloriosas que a nossa expressão produziu é pouco. O mundo é mais do que isso. Se tivermos o quadro, será perfeito, maravilhoso, mas uma fotocópia já serve. Temos – e podemos – conjugar esse esforço em fazê-los saber a história da arte com uma visita àquilo que é próximo deles, deixando e estimulando que dentro de cada um deles aflorem elementos como a evocação, a imaginação, a nostalgia, a memória. Assim, quando você pedir para um aluno que olhe para o mundo, que escolha um fragmento daquilo que interessa da sua cidade e da sua experiência nela, ele certamente irá eleger alguma coisa. O que é o mesmo que dizer que ele irá se escolher dentro das coisas que, em última análise, existem porque fazem sentido para ele. Ele vai se reencontrar no mundo.



O problema é que, quando estamos na cidade, temos objetivos. Vamos de um ponto a outro e não percebemos o que há no meio do caminho. Essa é a diferença da arte com relação ao resto, assim como da dança para a caminhada. Na caminhada, o objetivo é chegar a determinado ponto; na dança, é o corpo por ele só, com tudo o que pode oferecer, é uma certa ociosidade. E é fundamental para que você possa redescobrir o próprio corpo. (...) É esse livre pensar. É esse saber desinteressado. É essa capacidade de se abstrair, de focar a atenção numa coisa que se resolve ali mesmo. Não tem aquela razão pragmática de quem contempla o mundo com a intenção de buscar algo que está além dele.



FARIAS, Agnaldo. A arte e sua relação com o espaço público. In: Portal da Educação Pública [http://www.educacaopublica.rj.gov.br/biblioteca/educação_artistica/0002.html]. Acesso em 19/12/2009